Na semana em que se comemora o “Dia da Consciência Negra”, o racismo é um dos assuntos mais discutidos. No Brasil, racismo é considerado crime. Quem fala sobre isso e esclarece as principais dúvidas, é o delegado da Polícia Civil de Dois Córregos, Márcio Moretto.
O Democrático: Racismo é crime?
Márcio Moretto: É crime, sim. Existem algumas condutas específicas para se configurar crime de racismo. O mais conhecido e mais praticado é a injúria com conteúdo racial. É quando a pessoa se sente ofendida por outra, que aproveitou de uma situação da cor, da religião, e fez uma ofensa baseada nisso. Essa situação pode resultar, inclusive, na prisão em flagrante. É uma conduta grave e os crimes de racismo não prescrevem.
O Democrático: Quando um crime é considerado racismo?
Márcio Moretto: As pessoas pensam que o crime de racismo de injúria é cometido somente mediante o que ela fala. Mas não é assim. Inclusive, por gestos, a pessoa pode cometer o crime. Conheço um caso de uma pessoa que foi presa em flagrante ao cometer o crime contra um segurança negro de um estabelecimento. A senhora, para ofendê-lo, começou a imitar um chimpanzé. No local, além da vítima, também tinham testemunhas, e ela foi presa. Na internet também precisa de atenção. As pessoas acham que estão acobertadas no meio digital, mas também há crimes de racismo cometidos em comentários de Facebook, em mensagens de WhatsApp. As pessoas têm que ter noção do elas falam e da ofensa que fazem.
O Democrático: Quem pratica o crime de racismo pode ser preso?
Márcio Moretto: Esses crimes normalmente são graves. E todos os crimes que ultrapassam uma determinada faixa de ano de pena, podem resultar em prisão, inclusive, o caso da injúria com elemento racial.
O Democrático: Cabe pagamento de fiança para os presos por crimes de racismo?
Márcio Moretto: Depende da tipificação que é feita do crime, do tipo de racismo que foi cometido. Homicídio por conta de racismo, por exemplo, não vai ter fiança. Agora, se for um caso em que estavam sendo feitas ofensas mútuas e houve o crime de racismo, pode ser arbitrada fiança. Depende da gravidade do fato e da complexidade dele.
O Democrático: Qual o primeiro passo contra o racismo?
Márcio Moretto: O primeiro passo sempre é o registro do boletim de ocorrência. A pessoa também pode levar a reclamação ao Ministério Público, mas, de qualquer forma, isso vai ser encaminhado à delegacia e vai ser instaurado o inquérito. Por isso, é muito mais fácil que a ocorrência já seja registrada na polícia civil. Sendo configurado o crime, a gente começa de imediato o inquérito policial. E, se depender de representação, a partir do momento em que a pessoa represente, é dado início à investigação.
O Democrático: Qual o atendimento à vítima de discriminação racial?
Márcio Moretto: A Polícia Civil cuida da repressão criminal. A gente faz a investigação e o encaminhamento ao poder judiciário. Em alguns crimes que envolvem violência física, fazemos o encaminhamento para a saúde. No caso de crime de racismo, se a pessoa tiver um trauma maior, nos falta estrutura. Nesses casos, ela precisa procurar pelo serviço de saúde do município.
O Democrático: Existe um prazo para encaminhar o caso à Justiça?
Márcio Moretto: Depende da complexidade do caso. Algumas situações específicas exigem uma investigação um pouco maior.
O Democrático: Qua a orientação para quem for vítima de racismo?
Márcio Moretto: Que procure as autoridades competentes, pois existem meios para este tipo de ação ser coibido. É interessante as pessoas perceberem que vivem em uma sociedade miscigenada, todo mundo misturado, somos todos seres humanos. É um absurdo esse tipo de conduta. Basta a pessoa pensar se gostaria de ser ofendida por ter uma determinada característica física ou alguma deficiência. Esse tipo de ofensa também é racismo. Você tratar a pessoa de forma diferenciada porque tem um problema auditivo, um problema na perna, tudo isso é racismo. Quando a gente fala de racismo, não está colocando apenas a cor da pele. Infelizmente, o racismo está enrustido na nossa sociedade e ainda vai levar muito tempo para que isso acabe. As pessoas têm que se conscientizar de que não é dessa forma que devem agir.