
O ano se encerra sob o signo da controvérsia, com a aprovação da lei que reduz as penas aplicadas aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro — incluindo o chamado núcleo do suposto golpe militar atribuído ao ex-presidente Jair Bolsonaro. Um golpe que, à luz dos fatos objetivos, jamais se materializou. Sem armas, sem comando, sem tanques, sem cadeia de comando militar, o enquadramento jurídico da tentativa de ruptura institucional parece ter servido mais a uma lógica política do que ao rigor da justiça.
A condenação do grupo bolsonarista soa, para muitos, menos como a punição de um crime efetivo e mais como um expediente para impedir qualquer possibilidade futura de retorno eleitoral do ex-presidente. Antes disso, Bolsonaro já tivera seus direitos políticos cassados por expressar desconfiança em relação ao sistema de urnas eletrônicas durante uma reunião com embaixadores, em setembro de 2022. Discordar passou a ser tratado como delito. Questionar virou infração. A Justiça, ao que parece, passou a cassar a palavra — sobretudo quando ela contraria o poder instalado.
Nesta semana, São Paulo foi palco de um manifesto subscrito por representantes da sociedade civil em defesa da reavaliação do papel do Supremo Tribunal Federal. A proposta não é enfraquecer a Corte, mas recolocá-la nos trilhos democráticos, com regras claras e um código de comportamento que limite excessos e reforce a previsibilidade institucional. Hoje, os alvos são os bolsonaristas. Amanhã, pode ser qualquer cidadão, grupo ou liderança que se oponha às decisões de interesse do establishment político-judicial.
O Congresso reagiu, ainda que tardiamente, promovendo a redução das penas. Trata-se de um passo necessário, que deve alcançar todos os manifestantes de 8 de janeiro, sem distinções seletivas nem narrativas convenientes. A anistia, ao que tudo indica, virá — não agora, mas no futuro. Provavelmente quando o PT não estiver mais no poder e quando o STF passar por uma reformulação de seu ideário e de seus limites.
A democracia não se fortalece com exceções permanentes, nem com a criminalização do dissenso. Ela exige equilíbrio, freios recíprocos e, sobretudo, a coragem de reconhecer quando a Justiça deixa de ser árbitro para se tornar parte do jogo político.


