O percentual de famílias que relataram ter dívidas a vencer (cheque pré-datado, cartão de crédito, cheque especial, carnê de loja, crédito consignado, empréstimo pessoal, prestação de carro e de casa) atingiu 79% do total de lares no País, em agosto. Os dados são da Confederação Nacional do Comércio (CNC) que aponta que o crescimento da proporção de endividados acelerou em relação a agosto do ano passado, a proporção de endividados teve alta de 6,1 p.p. O número de pessoas que atrasaram o pagamento de contas de consumo ou de dívidas também cresceu em agosto, alcançando 29,6% do total de famílias no país.
A melhora no mercado de trabalho e as políticas de transferência de renda mais robustas têm favorecido os rendimentos das famílias nas faixas mais baixas, mas a inflação em nível ainda elevado desafia o poder de compra desses consumidores.
O problema é muito grave, mas estar inadimplente, no entanto, não significa estar desprovido de direitos. Ninguém discute a obrigação do devedor de pagar suas contas, mas não sem antes ter acesso ao contrato, aos dados sobre os débitos, à informação prévia à negativação e, principalmente, sem passar por situações de cobranças vexatórias. Hoje a realidade do empobrecimento se impõe a outras causas de endividamento, como descontrole financeiro. As pessoas pegam crédito para sobreviver, para pagar a luz, por exemplo, o consumidor precisa do dinheiro, os bancos emprestam. E, quando ele não paga, muitas vezes, essa cobrança é abusiva, com uma dezena de ligações por dia. Existem casos, por exemplo, de uma criança que atendeu a chamada e avisaram que o pai estava devendo.
O Procon diz que um dos erros comuns cometidos pelos endividados é se sentir obrigado a renegociar a dívida quando é procurado pelo credor. No desespero de sair da lista de negativados, consumidores acabam, às vezes, pagando contas que não devem e fazendo maus negócios, o que aumenta a dívida. O consumidor inadimplente não é obrigado a aceitar qualquer tipo de negociação, e sequer deve negociar sem todas as informações sobre a dívida, dados como juros, o custo total da renegociação, o prazo e uma avaliação do impacto no seu orçamento.
Naquele desespero, o consumidor olha o valor da parcela da dívida, vê que cabe no orçamento e acaba renegociando. As vezes é uma parcela que vai deixar seu orçamento muito justo e imprevistos vão acontecer. Se não está seguro, a orientação é procurar um Procon ou a Defensoria Pública, onde terá assistência.
É preciso ficar atento também a mitos, como a prescrição de dívidas em cinco anos, na verdade, cinco anos é o prazo estabelecido pelo Código de Defesa do Consumidor para o nome do devedor ser retirado do cadastro de negativados, mas isso não significa que a dívida não possa ser cobrada. Outro detalhe importante: é comum bancos e outras instituições venderem as dívidas de seus clientes para empresas terceirizadas de recuperação de crédito.
Veja algumas questões que devem ser observadas:
- A instituição tem direito a negativar o consumidor no primeiro dia de atraso. Mas, na prática, costuma haver tolerância de atraso de 30 dias antes da inclusão no cadastro de devedores. E a inclusão não pode ser feita antes de o consumidor ser comunicado;
- A trégua aos inadimplentes de serviços essenciais (água, luz, telecomunicações), concedida no auge da pandemia, não está mais em vigor. O fornecimento pode ser cortado em caso de inadimplência, mas o consumidor precisa ser informado antes;
- O consumidor inadimplente não pode ser exposto a ridículo nem submetido a constrangimento ou ameaça. A cobrança não pode ser feita a terceiros, como familiares e colegas de trabalho. Também devem ser respeitados horário de descanso e domingos;
- O devedor pode solicitar ao credor o cálculo discriminado da dívida, dados como custo total, juros, prazo de pagamento. No entanto, na prática, muitos consumidores alegam dificuldade até de acesso ao contrato.
- Ao firmar contratos de crédito à distância, por telefone ou internet, o consumidor tem o direito de desistir em sete dias.
Portanto, procure se organizar financeiramente, pois a principal consequência de não pagar as dívidas é ter o nome incluído nos órgãos de proteção ao crédito, o que pode levar a suspensão de serviços (como telefone, cartão de crédito e internet), dificuldade para alugar imóveis, entre outros.
Paulo Afonso, economista e prof. universitário