
O Ministério da Cultura volta ao noticiário, mais uma vez, associado a questionamentos sobre a aplicação dos recursos oriundos da renúncia fiscal. O foco do problema, contudo, não está no volume de projetos aprovados, mas no acúmulo histórico de iniciativas paralisadas na fase de prestação de contas.
A fragilidade dos mecanismos de prestação nunca foi exclusividade do MinC. Trata-se de uma deficiência estrutural do Estado brasileiro, recorrente em diferentes ministérios e programas incentivados. O desenho institucional é falho: quem autoriza não deveria ser o mesmo ente responsável por fiscalizar. O princípio da segregação de funções — básico em qualquer sistema minimamente eficiente de controle — segue ignorado.
Uma solução lógica e tecnicamente consistente seria transferir a verificação dos recursos incentivados à Receita Federal. Afinal, trata-se de renúncia fiscal, ou seja, de recursos públicos. O “Leão” já dispõe de estrutura, expertise e instrumentos para esse tipo de fiscalização. Ministérios, por definição, não são órgãos de controle — nem têm musculatura administrativa para isso.
O dado mais revelador, porém, permanece oculto no debate público. Dos cerca de R$ 540 bilhões oficialmente contabilizados em renúncias fiscais no país — número que, na prática, supera os R$ 800 bilhões quando consideradas todas as exceções e incentivos — a Cultura responde por aproximadamente R$ 2,4 bilhões. Isso equivale a cerca de 0,4% do total.
Ainda assim, é o setor cultural que carrega, sozinho, o estigma da ineficiência. Um diagnóstico conveniente, mas intelectualmente desonesto, que desvia o foco do verdadeiro problema: a ausência de um modelo nacional coerente de controle, transparência e responsabilização sobre a renúncia fiscal no Brasil.


