A prevalência de obesidade tem aumentado consideravelmente nas últimas quatro décadas e tal fato – somado à dificuldade de controle e alto índice de recidiva – faz da obesidade, atualmente, um importante problema de saúde pública. A Organização Mundial de Saúde (OMS), a partir de resultados de pesquisas realizadas em nível mundial, passou a reconhecer a obesidade não mais como uma condição, mas como uma doença epidêmica global do século 21, que precisa ser enfrentada mais efetivamente em razão da alta incidência na população infantil e das implicações na saúde integral das pessoas por ela acometidas, estando associada a um aumento significativo da morbidade e mortalidade, com profundas consequências econômicas e sociais.
Os números são alarmantes. Mais de 1 bilhão de pessoas no mundo são obesas – 650 milhões de adultos, 340 milhões de adolescentes e 39 milhões de crianças. E a situação no Brasil é igualmente preocupante. Estudo realizado pela Federação Mundial de Obesidade mostrou uma projeção para o ano de 2030, ou seja, como poderão estar os brasileiros daqui a oito anos. Os dados deste estudo apontam que a prevalência de excesso de peso pode chegar a 68% (cerca de sete a cada 10 pessoas) e a de obesidade a 26% (uma a cada quatro).
A obesidade é considerada uma doença de causas multifatoriais. Além da susceptibilidade genética, fatores ambientais, culturais, sociais e comportamentais – como o sedentarismo e os estilos de vida da sociedade moderna – podem contribuir para sua gênese. Sua presença favorece, em grande escala, o risco de aparecimento e agravamento de sofrimentos psicossociais e de doenças crônicas, que são classificadas, basicamente, em duas categorias. A primeira delas se refere às enfermidades resultantes de alterações metabólicas ocasionadas pelo excesso de gordura, incluindo: diabetes tipo 2, os cálculos biliares (as famosas “pedras” na vesícula biliar), hipertensão arterial, doença cardiovascular e alguns tipos de câncer. A segunda categoria envolve a questão do aumento da massa de peso em si, podendo causar osteoartrite, apnéia do sono, além do estigma sociopsicológico da obesidade, que favorece o surgimento de desordens mentais, como ansiedade e depressão.
No entanto, o que pouco se divulga são as implicações da obesidade na saúde bucal. Tanto mecanismos comportamentais, como biológicos, que envolvem os indivíduos obesos, podem impactar negativamente na condição bucal.
Em relação ao comportamento, os obesos tendem a apresentar hábitos alimentares menos saudáveis, como o consumo, em excesso, de doces, guloseimas e alimentos ricos em carboidratos. Além disso, nessa população, é comum a ingestão de alimentos com alta frequência ao longo do dia, ou seja, passam o dia ‘beliscando’ alimentos. E tais comportamentos, principalmente quando associados a um negligenciamento da higiene bucal, representam importantes fatores de risco para doenças bucais, especialmente cárie dentária.
A saúde gengival também pode estar mais comprometida em pessoas portadoras de obesidade. Neste caso, há um mecanismo biológico que explicaria esta associação. A obesidade, especialmente a chamada obesidade central – que é o acúmulo de gordura na região abdominal – favorece o aumento da produção e secreção de substâncias que ativam, ou aumentam, aspectos específicos de uma inflamação (substâncias estas conhecidas como citocinas pró-inflamatórias). A produção e liberação, em excesso, dessas citocinas pelo tecido adiposo – que é onde fica armazenada a gordura – faz com que elas cheguem até o periodonto (que são os tecidos de sustentação do dente) através da corrente sanguínea, favorecendo o aparecimento de doenças nessa região. Além do periodonto, essas substâncias podem atingir, ainda, as glândulas salivares, desencadeando, nestas, um processo inflamatório crônico, afetando negativamente sua função, sendo que a diminuição no volume do fluxo salivar costuma causar efeitos adversos como cáries, halitose (mau hálito), dificuldade mastigatória, entre outros. Além desse mecanismo, é importante destacar que um fluxo salivar reduzido é comum entre obesos, já que pode estar relacionado, também, ao uso de medicamentos utilizados para tratar comorbidades, que são as doenças associadas à obesidade.
Frente a isso, é possível afirmar que a obesidade se constitui em um importante fator de risco para problemas bucais e fica o alerta para os portadores dessa doença, para que incluam, em sua rotina, avaliações odontológicas periódicas, a fim de manter sua saúde bucal em dia.
Adriana Grael
‘Especialista, Mestre e Doutora em Saúde Coletiva’.